sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Do desejo enrustido


Comecei o dia com uma baita neurose. Sei bem como isso me aflige e quão pouco são as horas. Seria bala xita explicar. Ninguém pode viver o outrem.  Ninguém entenderia as aflições e expectativas, o corpo reagindo conforme a cabeça. Fácil falar. Ou pior, ou melhor, vindo, problemas, intrigas, paixões e quereres. Sabe-se lá o que viria, mas sentia e ainda sinto. Depois de certos acontecimentos que permeiam entre as adocicadas experiências dos livros e a agressividade das vistas, falhei. Meus olhos malditos. Minha deficiência narcísica. Tudo muito bem escondido no oco, nas retinas minhas e suas. Somos espertos, sabemos. Eu sei. Errei e erro, persisto porque acabo gostando. E dá uma vontade danada. Em você também, percebo. Nem sei. Afogo-me. Por que vejo o que desejo ver e não o quero? Delicia de me lamber e me ferir ao mesmo tempo, pode ser.  Sonhos e satisfações bem quistos no fundo do côco. Vida safada que mexe comigo. Eu adoro, podes crer. Lamber-te, eu safado, num desejo que racionalmente não sonho, mas quero. Lambo, lambo e lambo. Esbaldo-me em seus líquidos. Não desisto desse adocicado mel de tuas coxas, sonho. Quando te vejo nem quero. És velhas demais pra ti mesma, mas queres. Queres-me, eu sei. Tudo isso é uma delícia. E eu gozo muito com isso. Esse seu jogo de desejo maduro, bem maduro. É difícil escolher entre o animalesco desejo que tenho e seus perfeitos olhos de entrega. Sei muito bem o que queres. Já me disse outrora em insanidades  desconcertantes. Azul, amarelo, meu pau e nós dois. Foi o que disse. Mas sei que queres que eu te chupe. Eu chupo. Muito. É o que quero. Transformaste em o que sempre quis, na maneira em que se me apresenta, num desejo louco de chuveiro. É o que eu imagino. Teu corpo e o chuveiro. Problema altamente freudiano. A idade sempre me revela o que é bom, desde o inicio. Já me arrependi do que era moral e imoral. Não tenho costumes, regras. Entreguei-me ao hospício. Mas tu não. Tu és certa demais para o recheio da bala. Preferes se esfregar em meu corpo. Preferes o oculto e mentiroso. Ainda assim gosto e deixo-me levar. Porque és tu. Porque és escondida demais para achar. Qualquer dia teu profano te entregas como gostaria, eu sei. Estarei lá, como sempre ocultamente desejaste. Distante e teso, na avenida.

(Leonardo Schneider)

quarta-feira, 5 de novembro de 2014


Passei a vista sobre a velha papelada amarelada que se instalou sob minha mesa. Tem dias que tudo cheira a mofo ou a naftalina. Tenho um universo interno bastante caótico, esqueço-me do tempo e tudo se esvai. Quando me dou conta, como hoje, reparo que acumulei uma porção de pequeninas coisas, numa tentativa de qualificá-las com certa especialidade. Papeizinhos daqui e dali, frases de banheiro ou de muro. Mas o que verdadeiramente enaltece-se nessa minha fala são esses malditos entraves que minha boca proporciona. O certo é que a coisa toda esta lá no fundo, chacoalhando, ricocheteando no peito. Mil palavras, um bilhão de pensamentos desconectados e nada a dizer. Estou de amores com o silêncio. É um relacionamento sério que criamos e estamos construindo. Cumplicidade. Mas estou prestes a por tudo a perder. Todas as manhas, quando me debruço sobre minha mesa e observo meus papeis amarelados, por sinal muito gostosos, com suas calças justinhas, não me sinto impelido a absolutamente nada. Eles ficam me atentando constantemente, fazem promessas de um relacionamento melhor, de um casamento mais colorido. Juro que não sinto desejo algum, não dou à mínima. Mas há um gravíssimo sujeito que me bambeia as pernas ultimamente. Taquicardiaticamente ele me assalta. Esqueço-me de tudo, das responsabilidades, das promessas e juras que fiz ao silêncio. E como um lobo em pele de cordeiro, fico a espreita, esperando o silêncio ir dormir. Até me deito ao seu lado. Finjo que durmo e constantemente o observo. Pronto pegou no sono. Corro com o peito multi colorido até a janela. Os papeis em vão tentam desviar-me do foco. Lá esta ele. Quanta alegria. O vento. Como me sinto à vontade contigo, meu novo amor. Prometo-lhe largar tudo pra trás. O silencio tem sido tão rude comigo, acho que ele já não me ama mais. Acho que anda me traindo com outras pessoas, e as reconheço quando saio por aí. Fico lá a observa-lo, ele roça meus lábios e afaga meu cabelo. Não sei mais o que faço. Ele é tão sincero e carinhoso comigo. Estou nesse embate. Se alguém puder me dar um conselho ou qualquer coisa, me diga urgentemente. Aqui fala um apaixonado que sofre e não tem mais nada à perder. Com todo amor da vida. Um beijo.

(Leonardo Schneider)

quarta-feira, 1 de outubro de 2014


É tão difícil digerir cada instante. Para muitos é fácil vivê-lo. Basta agarrar-se a momentos idiotas, fazer coisas completamente imbecis, gastar, envaidecer-se, sorrir para fotografias enfadonhas e seguir trabalhando para ganhar seu circular sustento. Para o mesmo cíclico símio respirar.  E correr em rodas gigantes. Comigo é diferente. Há instantes de eternidade. Há coisas definitivamente sérias no quesito viver. A observação astuciosa permeia entre uma dessas seriedades. Mas fiquei mudo durante um tempo. Não conseguia escrever. Eis razão mais séria do que exprimir-se numa vã tentativa de repassar o que lhe é sério e absoluto? Ainda tento. Não desistirei facilmente, nem tão pouco fora gestação mal planejada, nem alarde, nem arte. Era nada, era eu. Hoje foi bom ter escrito. Apesar de escrever todo dia. Mas hoje foi diferente. Foi perfume, flores. Foi tudo que precisava sair. Gritar seria palavra apavorante, não? Mas era isso. Era essa minha intrínseca maneira de me expressar. Precisava que doesse, saísse lágrimas. Aquele maldito nó na garganta pra cruelmente não dizer nada. Precisava chorar. Era isso. Palavras não me vem a todo instante, mas incomodam meu sono, sussurram quando me deito, impelem-me a despertar. Sinto muitas vezes que é preciso escrever a lápis. Borrar com borracha, sujar a cama com aqueles malditos fiapos emborrachados. Não me vieram estonteantes palavras nesse texto, não me veio poesia alguma. Veio o que era quimo. Pós-digestivo. Esse bolo fecal que todos apreciam ao execrá-los. Esse alívio que transcende ao nível do prazer. É verdade, ando seco. Mas pastei em áridos desertos, sem comida nem sorrisos. Voltei com poeira nas vistas, pode ser. Voltei cambaleante e ressequido pelo vento. Mas voltei.

(Leonardo Schneider)

Sabe de uma coisa? Tenho baús no peito que não se fecham. Minhas madrugadas são pescar palavras certas, silábicas de roçar o céu da boca que agora me permitem tudo. Punho, caneta e papel. Não escrevo em teclados fadados à síntese de tudo. E fuxico, fuxico. Vou lá dentro. Então, remexendo em mim mesmo, e tudo isso me impressiona, tu sempre voltas, sapateia e rodopia como de praxe.  Defini-la com o passar do tempo, confesso, tornou-se expectativa ativa, cabal.  Porque andas em meus sonhos, com a orelha mordida e o tapa final. Tudo isso ainda pesa uma tonelada doída, mas assopro e passa. Ficou aquela eterna marca. Queria tanto lhe dizer que ainda lhe vejo árvore grande. Gosto dessas minhas maneiras de lhe enxergar. Árvore. Verdadeiramente dona de si, mesmo que com algumas ramificações tortas. Galhos secos e enrugados. Somos todos assim, tortos e enrugados. Mas tu sempre fora dona do sim.  Tinhas caminhos à frente, e sabias. Tu sempre soubeste.  Pequeninos detalhes lhe anteciparam. Mas tudo isso é construção de si, observação, entrega e humildade. Ensinaste-me a coragem dos atos, o assumir-se. E tu és assim, árvore. Tenho um livro inteiro sobre você, mas guardo nas minhas gavetas empoeiradas. Gosto de relê-la, do meu jeito, ao meu modo. A gente tem uma mania danada de recriar as pessoas, lugares. E quando tuas folhagens caem em meu jardim, refaço todo o emaranhado de conexões que vivi e ouvi de ti. É sempre bom. Fico sempre na espera. Aí vem o vento, tu chacoalhas, range e deixa cair um pouquinho de si. Eu que de bobo, só o sorriso, corro no quintal, sento-me ao teu pé, na tua sombra e deixo-me levar. Como são doces, suave e delicados esses meus momentos. Guardo cada um com enorme carinho, nas minhas caixinhas que ficam em minhas gavetas, como lhe disse. Sabe de uma coisa? Escrevo todo dia. Pra tu, pra mim. Escrevo pra quem gosto ou deixo de gostar. E choro sempre que releio. Porque de uma maneira ou outra tudo isso faz parte de mim, do que fui, do que somos. E carrego um regador pra onde vou, pois se vejo uma enorme árvore de galhas altas a balançar com o vento, lembro-me de ti e não me esqueço de aguar. Nunca. 

(Leonardo Schneider)

sexta-feira, 1 de agosto de 2014


Falar sobre você sempre fora tarefa dificílima. Um bloqueio de barricadas. Acho que a culpa vêm de seus olhos.  Não sei bem. Sei que te carrego comigo e, pra mim, isso basta pra uma noite de insônia. Já havia tentado escrever mil vezes um pensamento, uma frase que nos definisse. Nunca passei da terceira palavra. Hoje, não sei por que cargas d’água me senti mais à vontade. Acho que tem a ver com a coragem, talvez a palavra certa seja beleza. Isso!  Hoje têm a ver com a beleza!  E justamente hoje, a beleza que sempre tentei sintetizar, me pegou pelo calcanhar. E ficou tudo tão claro que senti uma enorme vontade escrever. Pois contigo descobri o brilhantismo dos verdadeiros sentimentos. O sublime, o quase raro. Coisa que pra mim, de fato, é o que definem certas almas. Distingue abruptamente o belo do feio. E isso, de certa forma, ajudou-me a constituir-me, devagarzinho, como poeta. Acho que foram as inúmeras e inesquecíveis experiências ao teu lado. Você sempre vibrante, sempre com luzes nas mãos. Esse seu jeito de enfrentar os desatinos da vida entre sorrisos e abraços. Tudo isso fora contribuindo. Eu sempre fiquei a te observar. Sempre ficava calado no cantinho. Prestava atenção nas tuas falas e gestos. E nesse meu posto, aprendi a entender as mulheres. Iniciara-me na arte de ama-las com peito forte, me ensinaste o caminho da verdadeira entrega, dos verdadeiros amores. Hoje, com nossas famílias sempre em edificantes momentos, quando nos juntamos, sinto ainda mais esse seu vibrante pulsar. Sinto ainda mais forte essa tua grandiosidade. Tu que guerreiramente foste de pacinho em pacinho sem olhar para trás, sem se deixar abater. Por certo tivera alguns medos, algumas incertezas. Mas genuinamente arrancastes com as próprias mãos e com o próprio suor os empecilhos que apareciam. Tenho orgulho de você, minha amiga. Tenho a verdadeira estima. E sempre saudade. Pois a felicidade que obtenho ao lhe ver, embriaga-me por completo. A beleza de que lhe falo no inicio, reside nessa nossa jornada de mãos dadas, nos encontros que decididamente escolhemos por antecipação, nesse trilhar infinito de viver. E estaremos, tenho certeza, sempre por perto.
Com todo amor do mundo.

(Leonardo Schneider)

quarta-feira, 18 de junho de 2014



Suas malas estão prontas? Irás partir com o mesmo mofo que trouxera. A mesma mala surrada, na busca pelo nada. Não percebeste que tua procura permeia a solidão dos frívolos abraços e beijos? Tens um único tesouro a tua espera e sei que és o mais valioso dentre todos. Mas teu silêncio velado, tua fria gruta do peito te distancia do verdadeiro objetivo de busca. Tu és a procura e o encontro. Não sabes? Vais pra longe? Longe de que? De quem? Paraíso? Não me venha com infantilidades! Sabes que tenho o peito quente, úmido e escrevo porque não durmo direito. O que vais encontrar, pequena? Exatamente o mesmo. O mesmíssimo processo de procura. E vais cavar e cavar, incansavelmente, tua própria cova rasa, teus sonhos novamente alçados a um determinado ponto. E de novo, de novo. Não vês que estas andando em círculos? Tu és o objetivo, pequena! Tu és o tesouro a ser encontrado. Tu és o que sempre procuraste. O espelho nos desloca, a vaidade nos cega, a dor nos esvazia. Não se perca lá fora. O que mais almeja esta arraigado em tuas costas, feito casco. Mas não vês nada além do caminho a seguir, do que há pela frente. Um simples giro em torno de si e tudo resolvido. Estas de malas prontas? Pra onde vai além de si mesma, pequena?

(Leonardo Schneider)

terça-feira, 10 de junho de 2014


Ela era vulgar. Puta mesmo. Exibicionismos baratos em palcos que cheiram a mofo. Gostava disso e não sabia agir diferente. Uns drinks a mais e logo se revelava. Certa vez me contara algumas de suas estripulias. Não havia perdão, nem ao menos culpa em sua pele. Ela era diferente. Sabia como adentrar nos inúmeros ambientes. Da esbórnia ao palacete. Sabia o que se passava na cabeça dos homens e se deleitava. Ela era uma mentira bem contada e sabia disso. Mas certo dia me interpelou:

-Me conte o que é o amor.

Sabia o que era, mas não sabia explicar. E eu que jamais esperava tal interlocução, fui pego desprevenido. Queria lhe falar. Queria lhe mostrar o que era, mas fiquei estático. As palavras saíam feito grunhidos. Fiquei nervoso. Mãos suadas. A maldita me acertara o calcanhar. Pobre coitada. Profissional no verbo amar, mas ignorante no substantivo amor. Ela aguardou alguns instantes, com os olhos fixados em meus joelhos.

-Ninguém sabe o que é. Mas mentir todos sabem.

Pensei muito a respeito do que dissera. Dei um gole no bico da garrafa. A garganta se fechara. Tomei ar.

-Roseletta, a vida não é tão ruim assim.

Uma gargalhada ecoou no ambiente. Era um riso sarcástico, animalesco. Bem distinto dos que riem com dor na alma. Eu sem graça nada pude fazer, a não ser, aguardar. Fiquei lá esperando seu show de falsos contorcionismos, a mão na barriga. Dei outro gole.

-Já acabou Roseletta?

Ela logo me olhou num tom sério, apertando os olhos como se fosse me devorar. Tinha certos tiques na sobrancelha direita quando ficava nervosa. Acendeu outro cigarro e baforou em minha cara. Cruzou as pernas com sua minissaia marrom, se posicionou de maneira ereta, feito quando as pessoas querem parecer ou dizer alguma coisa séria.

-Das minhas presas, você é a mais doce.

Aquilo soou como ofensa. Doce? O que ela pensava que eu era? Um menino frágil, de fácil manipulação? Ela não me conhecia bem. Cresci com a rudeza dos dias, o gris das horas. Ela era uma vagabunda sem amor. Quis mostrar valentia, mas logo me afagou os cabelos. Tombei de joelhos.

-Roseletta? Vamos embora pra outro bar?


De lá saímos. Eu sem saber o que sou. Ela, sem saber o que é o amor.

(Leonardo Schneider)

quarta-feira, 4 de junho de 2014



Agora depois de tantos desvarios e indulgências, coisas que a vida nos permite e ao mesmo tempo nos cobra, me sinto refeito. Refeito no equilíbrio tenaz e bem articulado que produzi nesse processo embrionário. Custei, mas pari. Agora posso entrar no mar, mas ainda tenho muito medo. Fico sentado na areia a espiar essas ondas. Afogar-se é uma experiência um tanto traumática. A falta de ar por afogamento deixa sérias sequelas no corpo. Mantenho-me com olhar fixo nesse atroz chacoalhar, mas fico de longe. Não me atrevo mais. Para me salvar deixei tudo, tudo afundar. Hoje percebo sutilmente o valor de certos acontecimentos, o valor de certos dias.  Percebo o vazio das coisas, a futilidade, o egoísmo que impregna. Hoje me sinto um tanto mais meio. Mais meio aqui, meio acolá. Não mergulho tão fundo, nem me arrisco a procurar ostras. Hoje as pérolas ficaram no tempo, não têm mais o mesmo valor. Dou-me o restrito, edificante e prazeroso tempo ao nada. Apenas nada. Tenho tido desejos que silenciam, é verdade. Mas a nau que corta a carne é a ultima esperança do naufrago. E a paciência. É preciso agarrar-se como mister ultimato. Esse estado de espírito indiferente que refugia, acalenta o respirar ofegante, essa pequenez consciente que livra das responsabilidades mais agudas, tudo isso têm contribuído para amenizar o aquático trauma que fora instaurado. Hoje, apenas hoje, me sinto um tanto mais originariamente vindo das águas.


(Leonardo Schneider)

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Ela sempre me instigou a escrever com amor.

Pra tu, bonitinha.....estas sempre aqui dentro......saudade engole a gente!!!!!

A Fabrícia ficou de fora.
Fora da fábrica e de Fabrício.
Mas uma pequenina loja a contratou.
Agora ela trabalha feliz.
Vende falos e picas.
Que o amor com todo seu látex e desejos pervertidos
fabrica eu, tu Fabrício e Fabrícia.


(Leonardo Schneider)

João e Maria


Descobri teu sabor na velocidade de um assalto. Teu cheiro já sabia de cor, mas o gosto me era desconhecido. De tanto carregá-la na minha sacola, resolvi com ímpeto montanhesco expor-te. Fora uma situação um tanto embaraçosa, confesso. Porque expondo tu, acabei-me por exposição, como a bola na parede em retorno às mãos. Fui-me entregando em partes bem fatiadas, discorrendo variavelmente entre eu e as fúteis banalidades dos acontecimentos. Tive febre e estou de cama. Roço o lençol na esperança de tua pele, de teu gosto. Escrevo todos os insanos desejos à lápis, para que a cada realização eu possa, uma a uma, apagá-las. Meu corpo arde e me sinto fraco. Esse meu modus operandi entre copos e garrafas vazias me desmascara em cada curva, em cada esquina. E a cada entrega, uma fraqueza nas pernas. Mas contigo foi diferente, contigo foi e esta sendo febril. Meu desejo por tuas coxas, tua boca e teu húmus me elevam a temperaturas tropicais. Imaginar-te em minha pele, é imaginar-me em braseiro. Tudo vermelho, contorcendo. Gritos, gemidos, suor e dor. O amor tem dessas coisas. Têm certos tratos, certos jeitos. O amor, em certos casos, finda-se indiscutivelmente, quando nos damos conta que entramos ou saímos da vagina.

(Leonardo Schneider)

segunda-feira, 5 de maio de 2014


Te segurei pelos cabelos, ajoelhei aos teus pés implorando. Era pura cumplicidade e entrega. Mas estas oca. Oca de tudo. Não percebestes nada. Teu enfadonho olhar é só para os cinzas e teus cinzas. A flor que te levei, atirei na lixeira como gostaria que eu fizeste. Esta lá e todo dia olho pra ela. Ela apodrece aos pouquinhos, como tu e eu. Mas carrego buquês aos montes. Não me entrego aos papéis higiênicos. Não escrevo em muros chapiscados. Tua maldita pele se dissolve em mim feito caspas. O que não queres de mim? Responda! Ainda guardo teu guardanapo. Teus talheres entreguei ao primeiro mendigo. Ele pegou e riu. Uma risada de dar inveja. Nossa mesa posta esta para as traças, mas penso em você. Maldita! Por que duvidastes? Pensas demasiadamente em tuas rugas e cacos. Esquecestes que é via dos fracos, dos cansados, dos imbecis. Carregue teu drama pra lama. Mas não se esqueça que lá também nasce flor. Mas como sou meio capacho, irei na latrina buscar tua rosa. Vou colocá-la num vaso com água. Quem sabe ela brilha e te mostra que querer conhecer, também é amor.

(Leonardo Schneider)

De tempos em tempos, me acento como de costume (gosto de ficar sentado), num pequeno banco azul desses de madeira, instalado na sacada de meu apartamento. É um banco simples, pintado à mão num tom azul claro. Lá fico alguns minutos, mas por ser um ato repetitivo, obsessivo, pelo fato de conter um aditivo, um algo a mais (que não a repetição de estar sentado), uma satisfação carnal (estou sempre fumando), posso considerar que esses minutos já há muito se transformaram em horas. Gosto muito desse banco. Minhas vistas ficam sempre a focar as mesmas coisas da sacada, numa sequência repetitiva. Já é automático. Tudo começa assim: Abro a porta, o vento vem. Olho os dois bancos. Esqueci-me de me referir ao outro banco. Um legítimo Bubu, de Philippe Starck, que apesar da pomposidade, não é o de minha preferência. Me acento no banco ao lado, o azul. Como ia dizendo, ao abrir a porta o vento vem ao meu encontro e eu me acento. Primeiro foco são as roseiras que cultivo, plantadas num vão de parede, no parapeito, criado apenas para plantas (pode-se dar outro uso, mas vejo que são para plantas). Na sequência repetitiva, logo vem a imponente Arruda. Olho-a da base até o topo e num relampeio, por detrás dela, minhas cebolinhas plantadas num vaso retangular. Gasto uns segundos nesse olhar. Torno a cabeça para o outro lado e lá estão minhas pimenteiras e meus Agaves. Adoro Agaves. Sempre os comparei com gentes. Depois olho pra rua, o mesmo passeio e o mesmo velho que sobe a rua, no mesmo horário, com sua bengala num passo lento. Não o conheço, mas fico intrigado com seus horários (sempre os meus). Essa repetição, por incrível que pareça, é um método que criei. Um método que me faz pular a sacada. Vencer o parapeito para um voo além da vista. São sempre novos lugares. O passeio nunca repete o caminho. E volto. O cigarro acaba no cinzeiro, como eu na estação de casa. Todo dia. Abro a porta da sacada, tudo acabado. Malas na cama, corpo no chuveiro. Esse método é minha preparação para além do estômago. Fico a repetir nesse vai e vem intelectual. Alguns passeios são mais intensos dos que os outros. Fico eufórico, irritado. Principalmente quando não consigo descrevê-los. Hoje não consegui. Escrevi por ausência, por buraco. Isso esta se repetindo. Voltarei ao meu banco azul nesse fim de tarde, que sabe uma viagem traduzida em um belo texto?

(Leonardo Schneider)

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014



É incrível a maneira como algumas pessoas me enxergam. Às vezes me dizem, de maneira entusiasta, que devo ser menos espalhafatoso, menos exagerado, beber menos, falar menos, fumar menos. Engraçado deve ser essa minha maneira de ser. E como parece criar uma caricatura de mim mesmo, uma personagem. Mas não. Necessito diariamente dessas minhas doses de tudo isso. Necessito, na minha alma imaginativa, de intensas experiências com o mundo. Não sei agir de outro modo, apesar de quando estou trabalhando, vivendo a mera vida aristocrática, eu seja o oposto de tudo que grita e arde. E nessa minha vida séria, onde tão somente sou ator, e onde realmente atuo dando o melhor de mim, é onde se encontra a mola propulsora de todo esse meu eu. Lá dorme um leão. A minha alma se guarda, atenta, cheirando minhas próprias conclusões, beijando e trepando com todas as possíveis concatenações que crio. Espero impacientemente o momento exato. E esse eu, todos os dias, vai se construindo com o decorrer das horas. Cada dia um eu diferente. Fico olhando o relógio com angustia, pois tem dias que a maquiagem irrita a pele. Não nasci para os palcos. O leão vai aos poucos se soltando da corrente. E todo dia ele foge. Foge por não dar conta das varas e jaulas. Foge porque é preciso fugir. E quando o vejo de longe, vindo ao meu encontro, sinto que tudo que me rodeia é um universo frívolo que não quero descartar. É como se o leão fosse me atacar e eu só tivesse um último pensamento ou desejo. Um último suspiro. Mas o leão me lambe. Dói ser só o leão e eu. Dói o fato de eu não me conter. Não conseguir ter medida ou regra pra nada. Amar dói, sabe? E eu amo e gosto que doa. Minhas fajutas inspirações vêm diretamente desse amor doído dos cinemas. Aquele amor que sempre vai embora pra nunca mais. E eu crio, recrio. O leão lambe os beiços e abana o rabo, senta ao meu lado. Somos nós dois nas noites da cidade. E quando vou embora, ele me leva até em casa, espera eu entrar. Aceno da janela ele olha pra trás. Fico observando sua imagem sumir no breu. Amanha, com certeza, nos veremos novamente.

(Leonardo Schneider)

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014



Hoje resolvi escrever pro além. Pra você e pra ele, pra ela também. Resolvi enfiar uma dúzia de palavras no papel, rabiscando-as com força, de maneira com que fiquem gravadas no verso da folha, criando certa textura. Um braile às avessas. Resolvi expressar-me ao avesso. É isso mesmo. Ao avesso.
 Tenho escrito pras minhas gavetas com meu pé direito enquanto calço os sapatos com as mãos. Tarefa um tanto complicada nessa minha nova configuração. Ainda não me habituei a alimentar direito, confesso. A caneta se alojara perfeitamente entre o hálux  e o segundo pododáctilo. Não sai nem por reza braba. Os tais vícios do ofício. Apesar das minhas mãos de curupira e os cotovelos de garrincha, não tenho tido grandes problemas de ir à padaria, mas as pessoas me observam, não sei o que pensam. Sei que me olham diferentemente dos demais. Sou torto no passo e na rua. Outro dia ao entrar no ônibus um velhote exclamou:
- Ei Sr. Poeteiro!! Pode sentar-se no meu lugar!
Pensei muito naquele velhote. Como sabe do meu ofício, que é tão meu e tão secreto? Serei eu torto por ser poeteiro ou serei eu poeteiro, por isso sou torto? Claro que não me sentei. Passei pela roleta, onde se encontrava o cobrador.
-Quanto custa a passagem? Perguntei.
Num tom ríspido respondeu o empírico observador.
-R$2,65!
Como era tudo que eu tinha no bolso, passei sem muito lhe dar atenção. Ele reparava.
A gente que é torta sofre com o mundo. Esse mundo reto demais, com pessoas retas demais. Por isso escrevo diariamente. Pensamentos em curva e frases em “S”. Vou ao meu mundo fantasioso, onde todos são tortos, onde tudo é disforme e danço. Em outra ocasião uma senhora me impediu de pôr os pés na mesa durante o almoço. Tentei lhe explicar que eu era assim ao contrário. Fui rechaçado.
No mesmo dia voltei para casa e escrevi como nunca. Escrevi pra você e pra ele, pra ela também. Todos no meu mundo. Porque de alguma maneira, na psique ou no agir, são também tortos como eu.
                           neider)
(Leo               Sch
      nar
          do
 

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014



Silenciar-se é a maior das fraquezas humanas. Nela gritamos mais alto do que quem realmente grita. Silenciar-se diante alguém ou fato, é indiscutivelmente o mais baixo ato, pois quem silencia, age assim, de maneira a se sentir inconscientemente superior ou infinitamente rebaixado. Somente quem silencia experimenta tal sensação. O que mais me intriga e o que mais confirma meu pensamento, é que quem silencia nunca sabe se agiu certo. Não consegue discernir o tal mecanismo messiânico. A outra face para o tapa. O silêncio mente, nega, corrompe. O silêncio é o nada. Não há amor ou ódio, muito menos o falso espírito filantrópico bastante difundido religiosamente.  Guardar para si o grito contido, naturalmente, esta diretamente associado ao não saber o que fazer. Esta associado às doenças da alma, pois o enfermo que berra, é o que melhora. O outro é moribundo. Apenas espera, de maneira covarde, o triste fim. O grito é a libertação, mesmo que acompanhada do arrependimento. Gritar é odiar e amar ao mesmo tempo. Gritar é se mostrar, é viver o intenso pulsar. Gritamos ao nascer e essa é nossa maneira de celebrarmos a existência. Então gritemos o mais alto que pudermos, pois quando as formigas entrarem pela boca, ao menos teremos a extrema certeza que estávamos de coração aberto.
(Leonardo Schneider)

terça-feira, 21 de janeiro de 2014



Essa noite lembrei-me de Ceci. Lembrei-me de seu corpo macio e úmido, do seu olhar apertado. Do jeito que prende o cabelo. Confesso que fiquei teso, pois Ceci sempre me fora uma baita inspiração. Por onde andarás? Com quem se deita? Será que calça meias pra dormir? Será que afaga o travesseiro em vão? Não quero pensar. Prefiro guardá-la naquela mesma mesa de botequim do centro da cidade. As pernas cruzadas e o sorriso de um eterno consentimento, a bolsa à tira colo, o cigarro na mão esquerda. Ceci tem muitos detalhes, eu sei. Mas acredito que se eu enumerasse todas as suas características, seus pequenos contornos e ondulações, me perderia em banais conjecturas, me perderia textualmente. Ceci é do mundo, não minha. Sempre a desejara, mas aos poucos descobri sua misteriosa arte de encontros e desencontros. Gatuna da noite, a vejo nos telhados, nas casas vizinhas. Algumas vezes só de passagem. Ceci é escorregadia feito peixe de aquário. Não se captura facilmente. Eu, de tanto descrevê-la, consegui minimamente, de um jeito tão absurdo e estranho, fotografá-la em meus textos. Ceci esta aqui agora. E cada vírgula, cada ponto ou sílaba, é um quebra cabeça que vou montando aos pouquinhos. São partes equidistantes de sua alma. Suas peças são bem misturadas, nada fáceis, apesar de minha habilidade. Ponho uma aqui, outra acolá. Um dia, quando faltar a última peça desse puzzle, vou escondê-la no fundo do armário, rasga-la em minúsculas partes, de forma que desapareça por completo. Quero sempre olhar Ceci faltando um pedaço. Pois assim ela me deixou e a assim pretendo deixá-la.
(Leonardo Schneider)

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014


Ceci será seu nome daqui pra frente, daqui pra trás. Nunca em momento algum havia lhe dado nome. E Ceci é um belo nome. Ceci não é diminutivo de Cecília. É apenas Ceci. E Ceci se afastou de mim já faz algum tempo, como eu me afastei de meu lápis. Escrevia-lhe sempre que dava. Jogava-me por inteiro num papel em branco, com a esperança de que ela, com toda sua dureza, talvez por infortunos que a vida dá, pudesse ao menos ler e se sensibilizar, amolecer. E Ceci amolecia. Eu escrevia. Quantas e quantas noites escrevendo, buscando cores, me entregando à Ceci. Ela com carinho e aspereza, me entregava seu corpo úmido, sua boca e seus olhos. O peito não. Talvez por medo, receio, não importa. Ceci se entregava do jeito que dava. Quando nos encontrávamos não havia palavras. Escrevíamos nosso amor nas paredes de banheiros, no corpo e eu tinha um medo danado. Ela abriu-me por inteiro, fez morada, cozinhou e arrumou nossa cama, mas partiu na primeira corrente de vento, desses que dobram as esquinas.  Nenhum pertence deixara para que eu pudesse guardar. Sofri sem textos, sem papel ou caneta. Sei bem de sua escolha, suas metas. Deixara apenas uma carta sincera, mesmo que doída. Com os seguintes dizeres:

-Nunca se esqueça de mim, meu querido. Fui-me embora para que morra poeta.
 
(Leonardo Schneider)

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014



Hoje acordei mais cedo, lembrei-me do teu cabelo. Engraçado essas pequenas idiotices que acabam por nos tirar o sono. Calço os velhos chinelos. O pó de café me aguardava como sempre no mesmíssimo lugar. Sujeito chato/metódico que sou, não tolero que ele saia andando por aí como bem quer. Dependo muito dele e ele sabe disso. Quatro colherinhas, não, cinco bem cheias para acentuar a realidade. Arrasto-me até o sofá enquanto a água e o fogão executam com maestria seus monos trabalhos. Lá fora o barulho da manhã. A noite fora embora levando consigo todos nossos sonhos, desejos, fantasias. A passarada anuncia a festa do dia. Não sei por que Deus resolveu criar todo esse estardalhaço nas manhãs, deixando o silencio nas noites escuras. Eu persisto no silêncio, nas noites de mim mesmo. Escrevo, rasgo, escrevo. Maldita condição essa que me persegue. Debruço-me sobre a mesa quando verdadeiramente bate o cansaço. Afundo a cara no papel, sinto seu cheiro. A chaleira apita feito troca de turno nas fábricas. O café está quase pronto. Basta medir bem a quantidade de água a ser despejada. Pura alquimia. Resolvido. Açúcar para equilibrar o fel de cada dia. Onde esta o açúcar? Maldito. Mandei-o dormir juntamente com o pó de café. Vasculho em toda a extensão do armário. Lá se encontram todas as nossas inseguranças explicitas, nossas manias. Quer saber mais sobre uma pessoa? Abra seu armário da cozinha. Que se foda esse açúcar! Quem precisa dele quando se tem mel? Minha favorita gosma dourada. Mas café com mel não é a melhor pedida. O mel tem seu lugar e deve ser preservado. Vou de café sem açúcar mesmo. Um gole. Puta que pariu! A vida já nos é amarga! Tudo bem. Finjo que esta tudo bem. Não esta nada bem. Preciso enfiar tantas palavras naquele fajuto papel. Ele me olha da mesa da sala. Cale-se! Eu sei, eu sei! Rodeio a mesa pensativo. Lá fora os malditos pássaros fazem a festa. Cagam em tudo e cantam. E eu aflito por umas míseras palavras. Talvez se cagasse e cantasse ao mesmo tempo, seria mais feliz. Mas só nas manhãs. Tenho certeza. Pego a caneta, uma lambida na ponta pra dar sorte. Silêncio. Parece noite novamente. Elas começam a bailar, bem desfocadas, de longe as vejo. Estão se aproximando, cada vez mais perto. Já as vejo se beijando. Venham meus amores! Estou aqui! Que prazer imenso! Elas chegaram. Suaves, leves. Minhas adoráveis palavras vieram hoje me visitar.
(Leonardo Schneider)