terça-feira, 21 de janeiro de 2014



Essa noite lembrei-me de Ceci. Lembrei-me de seu corpo macio e úmido, do seu olhar apertado. Do jeito que prende o cabelo. Confesso que fiquei teso, pois Ceci sempre me fora uma baita inspiração. Por onde andarás? Com quem se deita? Será que calça meias pra dormir? Será que afaga o travesseiro em vão? Não quero pensar. Prefiro guardá-la naquela mesma mesa de botequim do centro da cidade. As pernas cruzadas e o sorriso de um eterno consentimento, a bolsa à tira colo, o cigarro na mão esquerda. Ceci tem muitos detalhes, eu sei. Mas acredito que se eu enumerasse todas as suas características, seus pequenos contornos e ondulações, me perderia em banais conjecturas, me perderia textualmente. Ceci é do mundo, não minha. Sempre a desejara, mas aos poucos descobri sua misteriosa arte de encontros e desencontros. Gatuna da noite, a vejo nos telhados, nas casas vizinhas. Algumas vezes só de passagem. Ceci é escorregadia feito peixe de aquário. Não se captura facilmente. Eu, de tanto descrevê-la, consegui minimamente, de um jeito tão absurdo e estranho, fotografá-la em meus textos. Ceci esta aqui agora. E cada vírgula, cada ponto ou sílaba, é um quebra cabeça que vou montando aos pouquinhos. São partes equidistantes de sua alma. Suas peças são bem misturadas, nada fáceis, apesar de minha habilidade. Ponho uma aqui, outra acolá. Um dia, quando faltar a última peça desse puzzle, vou escondê-la no fundo do armário, rasga-la em minúsculas partes, de forma que desapareça por completo. Quero sempre olhar Ceci faltando um pedaço. Pois assim ela me deixou e a assim pretendo deixá-la.
(Leonardo Schneider)

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