quarta-feira, 4 de junho de 2014



Agora depois de tantos desvarios e indulgências, coisas que a vida nos permite e ao mesmo tempo nos cobra, me sinto refeito. Refeito no equilíbrio tenaz e bem articulado que produzi nesse processo embrionário. Custei, mas pari. Agora posso entrar no mar, mas ainda tenho muito medo. Fico sentado na areia a espiar essas ondas. Afogar-se é uma experiência um tanto traumática. A falta de ar por afogamento deixa sérias sequelas no corpo. Mantenho-me com olhar fixo nesse atroz chacoalhar, mas fico de longe. Não me atrevo mais. Para me salvar deixei tudo, tudo afundar. Hoje percebo sutilmente o valor de certos acontecimentos, o valor de certos dias.  Percebo o vazio das coisas, a futilidade, o egoísmo que impregna. Hoje me sinto um tanto mais meio. Mais meio aqui, meio acolá. Não mergulho tão fundo, nem me arrisco a procurar ostras. Hoje as pérolas ficaram no tempo, não têm mais o mesmo valor. Dou-me o restrito, edificante e prazeroso tempo ao nada. Apenas nada. Tenho tido desejos que silenciam, é verdade. Mas a nau que corta a carne é a ultima esperança do naufrago. E a paciência. É preciso agarrar-se como mister ultimato. Esse estado de espírito indiferente que refugia, acalenta o respirar ofegante, essa pequenez consciente que livra das responsabilidades mais agudas, tudo isso têm contribuído para amenizar o aquático trauma que fora instaurado. Hoje, apenas hoje, me sinto um tanto mais originariamente vindo das águas.


(Leonardo Schneider)

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