Toda vez que saio pra rua, tenho a nítida impressão, vendo
os olhos e bocas dos transeuntes que me cruzam o caminho, de sentir toda a existência
do que nunca fui, ou uma pequena impressão do que eu poderia ter sido. Sinto, talvez,
uma minúscula parcela do que eu realmente sou. Acabo por entrar, goela abaixo,
em todas essas bocas que vejo, vasculhando as entranhas com bastante cuidado e
perspicácia. Vou abrindo caminho nesse interior, indo cada vez mais fundo, tateando
pulmão, coração, esôfago e estômago. Apalpo tudo que posso. Quero sentir as
diversas texturas tão particulares de cada um. Saio na mesma velocidade com que
entro, e nesse lampejo de observação, sinto o outro em mim mesmo com
intensidade absurdamente avassaladora. Por certo, estou notoriamente errado das
impressões que acabo por roubar, pois verdadeiramente crio tais sentimentos a
partir de meu próprio ponto de vista, na experiência de vivenciar o outrem. Puro deleite. Tudo
bem. Pele por pele, reconheço, a minha já basta. Mas todo esse enredo preenche meu vazio
existencial. Há tantos outros em mim
mesmo. Só que esses tais se escondem com maestria no escuro, no oco, no buraco do
meu peito. É difícil agarrá-los por serem escorregadios e voláteis. Talvez, por
isso, por ser aparentemente mais fácil, busco nessa experiência exteriorizada,
os meus tantos “eus” perdidos pela cidade.
(Leonardo Schneider)
uau!
ResponderExcluirachei tão bonito, tão profundo e reflexivo.me fez pensar.
maravilha, homem!